Exú Capa Preta

− Admirado eu estou com a faculdade de usar a tecnologia e principalmente de escrever e ser notado, pois por muito tempo utilizei as mãos das pessoas sem que elas soubessem e hoje eu poderei me identificar, não que isso realmente importe, mas confesso que o meu coração deu espaço a uma ponta de amor próprio e quase não consigo me concentrar sabendo que minha hora chegou. Tive que regrar e maneirar no linguajar e principalmente na postura (não que eu já não tenha feito isso, pois não sou uma entidade exclusiva da Umbanda) e estou aqui agora sendo mais que apenas um espírito que fuma e bebe aos olhos de vocês, aliás aí está um problema porque infelizmente poucos de vocês vêem além disso. Quem sabe com o conhecimento do que acontece aqui os olhos e as consciências se abram e vão além do horizonte. O céu é o limite e terras inexploradas pela consciência esperam por vocês, a pergunta é: vocês estão preparados?

“Meu nome hoje é Exu Capa Preta e venho através dessas mãos e da pouca consciência que este médium empresta lhes colocar algo na cabeça. Além das velas do seu congá, além dos atabaques e dos ritos da sua Umbanda existe muito mais e seria muito interessante que vocês segurassem na barra da minha capa e entrassem nesse portal junto comigo, assim quem sabe vocês tomem coragem e vergonha na cara para parar de perder tempo e assim caminhar junto de nós e de nossos mistérios para buscar algo além do físico na religião de vocês, mas quem sou eu para abrir as vossas consciências.... Muitos dirão até que eu não deveria escrever, mas saibam que o trabalho não é sobre os Guias dos pais da Casa de Caboclo, uma porque os guias nem são uma exclusividade de vocês. Muito me irrita ouvir vocês dizendo “olha o meu Exu” ou “meu Caboclo”, pois não somos propriedade de vocês, somos livres. Mas como ia dizendo, muitos de nós Guias que trabalham na Casa de Caboclo irão usar desse mecanismo e assim queremos quebrar alguns paradigmas senhoras e senhores. “

“Eis que me faço presente entre vocês e o que vejo são pessoas que da minha imagem fazem mal juízo ou insinuam medo do Exu que pouco fala. Me pergunto por que você, isso você aí, não vem conversar comigo? Eu sou mais educado do que você imagina e, sem nenhuma prepotência, sou mais instruído nesse momento (risada).”

“Contarei aqui um pouco de mim, nasci na Espanha, fui de uma família que pouco tinha. Aos sete anos de idade minha mãe me levou até Barcelona, lá me deixou com padres em um mosteiro (sim senhoras e senhores, fui educado na fé católica) e desde esse dia não vi mais aquela mulher que para mim fez o melhor. Cresci diante do rigor e da soberba que a batina da época me trazia e logo conheci os caminhos que me levariam a desgraça, já que eu queria mesmo era chegar a Roma e para isso traí, roubei e a última coisa que eu realmente lembrava era de Jesus. Por ser alguém de grande charme eu alcancei alguns títulos, um deles me fez inquisidor, eu tinha o poder que queria. Ah o poder! Esse doce mel que nas mãos erradas se torna fel.... Antes de uma década, eu com julgamentos impróprios, já havia assinado uma centena de sentenças de execuções na fogueira, uma delas darei nome para que vocês não fiquem de palhaçada. Foi aquela que me trouxe aqui, o espírito que vocês conhecem como Padilhazinha e esta parte deixarei para ela contar, pois nada mais justo...”



− Vocês sabem que eu ainda vou vir aqui contar muita coisa nesse negócio, mas agora vou falar desse moço aí e porque ele se lascou comigo! 

“Eu tive que ir buscar ele no que vocês chamam de umbral (e eu de inferno mesmo!). Não fui condenada injustamente já que eu gostava mesmo era da magia (a magia que vocês são froxos para praticar), só que como hoje vocês me acham ruim imaginem isso a mil anos atrás, sem um pingo de conhecimento! Eu, depois de ser torrada por ele, me juntei com os espíritos que me ajudavam na magia e fiz ele se entregar a luxúria, a bebida e a coisas que não compensam ser faladas aqui e, em uma noite fria e triste ele cometeu um atentado contra a Lei Maior. Só que diferente do que vocês pensam, as coisas aqui são divididas e quando vi o que fiz minha consciência não suportou, foi aí que aproveitaram e me socorreram (sobre isso também contarei só depois), anos se passaram e Seu Capa Preta se perdeu no inferno.”

“Depois de tratada pelo Velho, eu desci até as profundezas e enfrentei junto com o Velho o fogo da desgraça (as dores até hoje me atormentam e eu nunca mais tive coragem de ir tão profundo) de lá com muito custo eu consegui pegar em mãos o já feto (ou verme) que por parte fui responsável por criar. Eu limpei suas feridas, seu corpo carregava as chagas dos que ele havia queimado e no espírito o amor e o ódio que nutria por mim. Por um século Josias ficou na ala de recuperação e eu todos os dias ia ajudar limpando suas feridas com os unguentos que o Velho fazia. Depois de sua recuperação ele voltou a Terra e eu tive que ficar aqui, pois ainda tinha muito o que fazer. Assumi minha tarefa com muita dor e hoje a minha magia salva, cura e ainda luto contra meus monstros. Agora deixa ele continuar falando...”



− Viram o que a mágoa produz e o que a falta de conhecimento faz? Sim, por isso não se enganem ou se iludam com esta posição egoísta de que vocês não são responsáveis pelo que outro faz, pois sua parcela na escuridão do outro será cobrada. Sejam mais que médiuns, sejam luz na vida do seu irmão. Construam pontes e sejam aquele que traz a espada na mão, mas não a use para fazer a sua justiça, pois a sua justiça é mesquinha e trará grande prejuízo a você e aos seus. 

“Que meu Pai Xangô ilumine o caminho de vocês assim como faz com o meu, hoje Exu Capa Preta tem a certeza que carrega na barra de sua capa a responsabilidade por seus filhos e por seu mistério...”

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